segunda-feira, 14 de junho de 2010

O DESENVOLVIMENTO DO PROCESSO DE ATENÇÃO

O DESENVOLVIMENTO DO PROCESSO DE ATENÇÃO


Artigo Acadêmico
Odilon Manske 26/07/2007


RESUMO

O desenvolvimento do processo de atenção diz respeito a uma função psicológica importante onde a atenção está diretamente ligada à cristalização de interesses, cujo processo está ligado à interiorização da significação do mundo exterior mediada pelos outros. Ou seja, é através da mediação dos adultos que os processos psicológicos mais complexos tomam forma. No ser humano esta mediação ocorre primeiramente através dos pais, onde na mais tenra idade ela começa a significar as coisas e é também onde a criança, dependendo do tipo de relação com o círculo familiar, começa a desenvolver as primeiras noções de limites e conseqüentemente de disciplina, que irão influenciar positivamente ou negativamente mais tarde no processo de ensino-aprendizagem.

Palavras-chave: Interesse; Atenção; Aprendizagem.


1 INTRODUÇÃO

Com este estudo analisaremos o desenvolvimento da atenção desde a mais tenra idade da criança e o seu desdobramento posterior no processo de ensino-aprendizagem.

Na perspectiva da atenção voluntária, resgataremos princípios como disciplina, obediência e limites ainda no seio do círculo familiar com o intuito de preparar a criança para o mundo exterior. E é na escola, através do processo ensino-aprendizagem que ocorre sistematicamente a apropriação da cultura e o conseqüente desenvolvimento do indivíduo.

Abordaremos questões relativas à atenção involuntária ou distração, de como ela pode afetar o desempenho da criança em sala de aula ou na execução de deveres escolares em sua própria casa. Uma vez que atenção e distração são levadas a novas fronteiras, com uma seqüência interminável de novos produtos, fontes de estímulos e informações que devem ser filtradas através da mediação principalmente do círculo familiar, estabelecendo desta forma limites no cotidiano das crianças.

Discutiremos ainda aspectos relativos ao transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH), uma vez que as estatísticas assustam e, cada vez mais escutamos relatos dos educadores sobre alunos problema que a psicologia rotula de hiperativos com déficit de atenção. A pergunta é: Como se deve proceder com o diagnóstico? O aluno apresenta esses sintomas só na escola? Só em casa? Ou em ambas? A quanto tempo?


2 A RELAÇÃO ENTRE INTERESSE E ATENÇÃO NO DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA

A aprendizagem sempre inclui relações entre pessoas, as relações do indivíduo com o mundo estão sempre mediadas pelo outro. A criança aprende o mundo através dos outros, aqueles que fornecem o significado, permitindo-lhes pensar o mundo a sua volta. É aí que entra o papel do educador enquanto mediador, pois é ele que orienta no processo de apropriação da cultura.

Cabe salientar que a aprendizagem da criança inicia-se muito antes de sua entrada na escola, isto porque desde o primeiro dia de vida ela já está exposta aos elementos da cultura do meio e à presença do outro, que se torna o mediador entre ela e a cultura. A criança vai aprender a falar e a gesticular, a nomear objetos, a adquirir informações a respeito do mundo que a rodeia; ela vai se comportando de acordo com as necessidades e as possibilidades.

Já nesta tenra idade ela vai significando algumas coisas, como por exemplo, na atividade lúdica em que um determinado brinquedo é capaz de atrair sua atenção por mais tempo que outro. Isso ocorre porque já neste estágio ela é capaz de apresentar interesses próprios e a partir daí desenvolver conseqüentemente a atenção voluntária para determinada coisa ou objeto. Portanto, podemos ver que existe uma conexão forte entre interesse e atenção voluntária já nos primeiros anos de vida de um ser humano.

Contudo vale frisar que neste período, nem todos os interesses são mediados, as escolhas individuais das crianças muitas vezes passam ao largo do desejo dos pais. Por exemplo, os pais presenteiam a criança com uma bolinha colorida, em resposta a criança não demonstra interesse nenhum no objeto, sendo este incapaz de prender a sua atenção, no entanto, sempre que a mesma criança tem a chance, longe do olhar dos pais, ela se prende brincando com água ou terra, sendo que estes dois elementos conseguem prender sua atenção por períodos relativamente longos de tempo. Isto eu denomino como sendo a centelha para o desenvolvimento de interesses próprios, diferentes daqueles que os pais tentaram mediar, porém, sendo importante que limites sejam estabelecidos.

Em nem todas as atividades da criança está o dedo do outro, ele está muito mais presente na hora de significar as coisas. Exemplo disso é quando o pai diz: - Não chegue perto desse cachorro que ele morde. Em relação a este exemplo a criança certamente irá perguntar: - Por que ele morde? Provavelmente isto se dá porque ela ainda não sabe distinguir entre o cachorrinho de estimação, com o qual é acostumada a brincar e o cachorro do vizinho que não conhece e que realmente pode causar-lhe danos. Para ela, todos os cachorros são iguais ao seu e, portanto não entende porque o cachorro do vizinho morde.

Nesse exemplo podemos ver claramente o papel dos pais enquanto mediadores entre a criança e o mundo externo, mais precisamente quando significam as coisas. È óbvio que o pai deverá explicar porque o cachorro do vizinho morde. A partir desse momento a criança vai começar a distinguir o seu animal de estimação dos outros, ela será capaz de se auto impor limites em relação à tentação de brincar com outros animais que não conhece. Aqui aparece pela primeira vez a questão da disciplina na consciência da criança, não como algo imposto, mas como algo aprendido.

Seguindo este raciocínio, podemos dizer que a qualidade da mediação dos pais entre a criança e o mundo exterior, pode contribuir em larga escala para um desenvolvimento saudável da criança e surtir efeitos positivos no processo de atenção.

De outro modo, tratando-se de pais relapsos que sequer respondem satisfatoriamente às indagações de seus filhos, os mesmos provavelmente irão se desenvolver com mais erros que acertos, podendo levar à seqüelas ou traumas futuros, como também a problemas de disciplina, uma vez que as coisas do mundo exterior não são significadas não é possível a própria criança estabelecer limites, podendo levar a problemas sérios na aprendizagem.

É, portanto no seio da família que devemos procurar as respostas para a falta de atenção e a indisciplina das crianças em fase escolar. Impor limites está na ordem do dia. Pois não só os interesses da criança devem prevalecer, até porque estes interesses estão sendo desvirtualisados pelo excessivo consumismo, com uma seqüência interminável de novos produtos, diversas fontes de estímulo como a televisão, vídeo game e outros, além das más companhias quando ela está na rua. Essa gama de relações leva a criança a desenvolver outros interesses daqueles que de fato irão contribuir para a sua formação e ao invés de contribuir para o processo da atenção esses outros interesses levam a distração, onde a escola passa a ser vista como uma brincadeira a mais. Portanto, faz-se necessário que também os interesses do círculo familiar se interponham, com o estabelecimento de limites e metas a serem atingidas.


3 ATENÇÃO VOLUNTÁRIA, INVOLUNTÁRIA E DISTRAÇÃO NO AMBIENTE ESCOLAR

Podemos dizer que existe uma ligação entre interesse e atenção voluntária. Assim a criança seleciona as coisas que para ela tem significado importante. No ambiente escolar ela deve ser estimulada a compreender o porquê e a importância dela estar ali, pois para a criança desenvolver plenamente a atenção é necessário o processo de entendimento do significado daquilo que está fazendo. Neste aspecto é importante dizer que o rendimento em sala de aula, pode ser afetado a partir do tipo de relação que o educador estabelece com os educandos. Certas qualidades do educador ou características de personalidade como paciência, afeto, dedicação, vontade de ajudar e criatividade podem despertar o desenvolvimento da atenção nos alunos.

O contrário da atenção é a distração, que nada mais é do que atenção voluntária em outras coisas. Por exemplo, no final de semana que passou, nas coisas que vai fazer depois da aula, nos problemas mal resolvidos em casa, na encrenca de rua, no jogo de bola etc. Portanto os educandos precisam de estímulos e docentes eficientes e preparados para realmente significar a cultura para eles.

De qualquer maneira o objetivo principal durante a aprendizagem de qualquer atividade é fazer com que os alunos obtenham sucesso e sintam prazer no que estão fazendo, isto sim desperta a atenção. Porém, isso pode ser proporcionado só em parte pelo educador, uma vez que o aluno já traz diferentes interesses e uma gama de relações com o mundo externo para dentro da sala de aula, os docentes costumam se referir a isso como “já veio de cabeça feita”.

Já a atenção involuntária pode ocorrer em sala de aula na medida em que os alunos ficam submetidos a ruídos externos, conversas paralelas e brincadeiras entre outros colegas, desviando a atenção daquilo que estavam fazendo. Ou ainda na própria casa, onde é comum ver as crianças fazendo os deveres escolares na frente da televisão, prejudicando dessa forma a atenção necessária para a compreensão ou a resolução dos afazeres.


4 TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE (TDAH)

É comum hoje ouvir queixas dos educadores relativos à problemas de falta de atenção e hiperatividade das crianças em sala de aula e conforme estatísticas internacionais aplicadas no Brasil 3% a 5% das crianças seriam portadoras do transtorno de déficit de atenção e hiperatividade. Se compararmos este índice com as estatísticas deste transtorno nos Estados Unidos da América, que é economicamente e socialmente muito mais desenvolvido que o nosso país, ele é bem mais baixo. Contudo, preocupa tanto aqui como nos EUA a forma de querer resolver este “distúrbio”, pois segundo Marinoff (2006, p. 47):

Em 1996, 5,2 milhões de crianças – 10% das crianças americanas em idade escolar – foram diagnosticadas com distúrbios de atenção e comportamento. A “cura” para essa “epidemia” é Ritalin , (sic) cuja produção e venda – e efeitos colaterais horripilantes – aumentaram rapidamente. É muito bom para o negócio de remédios; não tão bom para as crianças. Não existe a menor evidência clínica de que o TDAH seja causado por uma doença cerebral específica, mas é a queixa que justifica declarar mentalmente doentes milhões de crianças americanas, drogando-as por coerção e registrando de forma permanente o “diagnóstico” de “doença mental” em suas fichas.

Traçando um paralelo com a realidade americana, aqui também é utilizado o metilfenidato sob a forma comercial de Ritalina para o tratamento deste distúrbio, conhecido vulgarmente como droga da obediência. Por que crianças normais, saudáveis, curiosas – e às vezes indisciplinadas – têm problemas de prestar atenção na escola? O distúrbio de atenção e comportamento é uma possibilidade; há muitas outras. Também pode ser por falta de motivação, de disciplina, de um tema a ser estudado, falta de padrões que exijam uma aprendizagem, por causa de professores incompetentes e de pais indiferentes. Pode ser que em casa ou na escola não exista nenhuma autoridade moral para inculcar virtudes nestas crianças (MARINOFF, 2006).

Portando é necessário que se tenha uma certa dose de cautela ao afirmar que esta ou aquela criança tem distúrbio de déficit de atenção e hiperatividade. Para ser diagnosticado como tal, é necessário o procedimento de profissionais competentes envolvendo toda a relação da criança, tanto na escola, em casa, como na rua. Ou seja, os vários ambientes da vida desta criança devem ser levados em consideração e estudados minuciosamente e ficar atento quanto a ocorrência destes sintomas, se eles ocorrem apenas em casa ou somente na escola? Ou em ambas? No período a ser avaliado eles se mantém constantes ou são esporádicos? Tudo leva a crer que sintomas que ocorram em um só ambiente deve atestar para a possibilidade de que a desatenção e hiperatividade possam ser apenas sintomas de uma situação familiar caótica ou de um sistema de ensino inadequado.


5 CONCLUSÃO

Com a abordagem desse estudo, concluímos que as relações do indivíduo com o mundo sempre são mediadas pelo outro. E no processo do ensino-aprendizagem isso ocorre através do papel do educador enquanto mediador entre a criança e a cultura do mundo.

Na medida em que a criança começa a significar as coisas ela desenvolve seu senso de interesses o que está diretamente ligado à atenção voluntária. No entanto, percebemos que nem todos os interesses podem ser mediados, uma vez que as escolhas individuais estão relacionadas de como ocorre a significação das coisas na psique da criança. Esta significação diferenciada acompanha o ser humano durante toda a sua existência.

É na mais tenra idade, no circulo familiar que a criança aprende a desenvolver, através da significação das coisas, seus próprios limites, que poderão contribuir positivamente no decorrer do processo de sua aprendizagem. Como vimos também, é a família que deve primeiramente estabelecer limites e a escola deve corroborar com isso, devolvendo ao educador a autoridade moral em sala de aula.

No ambiente escolar a criança deve ser motivada a estimular a significação do porque e a importância dela estar ali. Onde a qualificação, eficiência e criatividade do educador podem desempenhar papel importante no desenvolvimento do processo de atenção dos alunos.

No entanto, algumas crianças podem apresentar problemas neurobiológicos relacionados à déficit de atenção e hiperatividade, porém, estes devem ser analisados com extrema cautela, uma vez que o assunto envolve muita polêmica. Hoje, vivemos num mundo em que parece fácil resolver todos os problemas à base de medicamentos, quando muitas vezes a resolução do problema pode estar na nossa casa ou escola.


7 REFERÊNCIAS

MARINOFF, L. Mais Platão menos Prozac. 10. ed. São Paulo: Record, 2006.

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