segunda-feira, 14 de junho de 2010

ALIMENTAÇÃO E GERAÇÃO DE ENERGIA NOS TELEÓSTEOS DE ÁGUA DOCE

ALIMENTAÇÃO E GERAÇÃO DE ENERGIA NOS TELEÓSTEOS DE ÁGUA DOCE


Artigo Acadêmico

Odilon Manske  03/05/2007


RESUMO

A alimentação e geração de energia nos teleósteos de água doce, está intrinsecamente relacionada a inúmeros fatores que dizem respeito ao meio em que vivem e às demandas específicas em nutrientes de cada espécie. Como os peixes são cultivados em tanques ou açudes, constituindo desta forma um sistema ecológico, que deve ser estudado e conhecido sob todos os aspectos de sua dinâmica para não incorrermos em práticas equivocadas que podem levar ao fracasso total do empreendimento ou degradar o meio ambiente.

Palavras-chave: Nutrientes; Energia; Peixes.


1 INTRODUÇÃO

Com esse trabalho pretende-se traçar interligações entre demanda de nutrientes dos peixes cultivados em água doce, a capacidade de absorção dos mesmos e as variantes do meio, (limnologia física, química e biológica), na alimentação e conversão nutricional.

Destacaremos ainda a necessidade elevada de proteínas (compreendendo os aminoácidos essenciais para os peixes na sua composição), no balanceamento do alimento disponibilizado e discutiremos do porque da baixa demanda de lipídeos, uma vez que se trata de fonte poderosa na geração de energia.

Analisaremos a importância do plâncton na alimentação dos peixes, as formas de otimizar sua presença nos meios de cultivo e seu valor nutritivo, principalmente na fase larval e de alevinagem.


2 DEMANDA ENERGÉTICA DOS PEIXES DE ÁGUA DOCE

Como outros animais, os peixes exigem dietas com teores adequados de energia, proteína (aminoácidos), minerais, vitaminas e lipídeos para a manutenção e produção. As exigências variam entre e dentre as espécies e são influenciados por diversos fatores.

De acordo com Moreira et al. (2001, p. 59):

A energia não é um nutriente, é liberada durante os processos de oxidação metabólica dos carboidratos, lipídeos e aminoácidos. Normalmente é expressa em caloria (cal), que é definida como a quantidade de calor que é necessária para elevar a temperatura de 1g de água em 1 grau Celsius (1 ºC). Outra unidade utilizada é o joule (J), sendo que 1 joule é a energia requerida para acelerar a massa de 1 kg a 1m/s a uma distância de 1 m. Como joule e caloria são unidades pequenas, na prática, o conteúdo de energia dos alimentos é expresso em quilojoule (KJ = 10³ J).
A energia bruta é toda a energia consumida e que está presente na forma de carboidratos, lipídeos e proteína. O que interessa aqui é a que é metabolizável, que é a energia do alimento menos a das fezes, urina e brânquias. Ela é utilizada para os processos metabólicos.

Ainda segundo Moreira et al. (2001, p. 60), “O incremento calórico (IC) representa a energia perdida pelos peixes na forma de calor [...]”. Esta perda de energia originada pelo processo metabólico diz respeito à digestão e absorção que nos peixes é baixa em relação aos animais homeotermos.

Sabemos que o valor energético dos alimentos depende de sua composição química, por exemplo, o porcentual da proteína bruta (PB) num determinado alimento não fornece nenhuma idéia do verdadeiro valor energético, deveríamos saber das exigências dos aminoácidos essenciais requeridos pelos peixes na composição das proteínas. Para Moreira et al. (2001, p. 61), “os peixes exigem 10 aminoácidos essenciais: arginina, histidina, isoleucina, leucina, lisina, metionina, fenilalanina, treonina, triptofano e valina”.

Para formular dietas mais precisas, deveríamos levar em conta a energia digestível e não a energia bruta, pois é necessário determinar o coeficiente de digestibilidade da energia.

De uma forma geral os peixes são exigentes quanto a presença de proteína na dieta. Ela está relacionada com o balanço de energia da dieta e a composição e digestibilidade dos aminoácidos dos ingredientes. Em relação a frangos e suínos a dieta dos peixes possui elevado conteúdo de proteína bruta, mas variando conforme a espécie, para Carpas o teor exigido é de 24% de PB e para a Tilápia do Nilo é de 32% já para aves e suínos é de 18 – 21% e 13 – 22% de PB respectivamente.

Já os lipídeos são compostos insolúveis na água e a porcentagem na dieta varia em função da proteína-energia e do tipo do lipídio utilizado, uma vez que a deficiência não permite adequada retenção de proteína, enquanto o excesso pode elevar o conteúdo de gordura visceral e corporal. A outra desvantagem no excesso de gordura é a longa permanência dela no trato gastro-intestinal, fazendo com que o peixe não se alimente, impossibilitando dessa forma a digestão e absorção de outros nutrientes que poderiam ser ingeridos durante este período. Estudos comprovam que para peixes onívoros o conteúdo ideal de lipídeos no alimento é de 3%, já para os carnívoros este índice é bem maior, já que para eles os lipídeos e a proteína são fontes primária de energia.


2.1 A FUNÇÃO DA CONCENTRAÇÃO DOS ÍONS DE H+ (pH) PARA OS ORGANISMOS AQUÁTICOS

Importante notar a ação das enzimas que ocorrem nos substratos constituídos por carboidratos, proteínas e lipídeos. Para que as reações enzimáticas e todo o metabolismo ocorram satisfatoriamente nos peixes é necessário que as condições das variáveis do meio, como temperatura e pH estejam de acordo. No caso do pH é importante proceder com análise do solo onde a criação do pescado vai ocorrer ou se a criação já estiver sido instalada, procede-se com a análise da própria água utilizando-se o reagente apropriado. Para se obter bons resultados preconiza-se um pH neutro ou ligeiramente alcalino, ou seja, 7.0 a 8.5.

Caso o solo e/ou a água do meio seja ácida ou ligeiramente ácida, usa-se geralmente a calagem para neutralizar a acidez deste ambiente. No caso específico do município de Vacaria-RS, utiliza-se o calcário dolomítico ou a cal virgem na proporção que varia entre 1,8 a 2,5 toneladas/ha.

A prática da calagem e a conseqüente correção do pH, além de favorecer as reações enzimáticas, ainda proporciona um maior desenvolvimento de plâncton, principalmente algas (produtores primários); provoca o depósito de matéria orgânica em suspensão; fornece o cálcio necessário para as estruturas dos organismos aquáticos e para o esqueleto dos próprios peixes e auxilia na reprodução dos peixes, pois estudos comprovam que ovos e larvas são mais sensíveis ao pH baixo do que peixes adultos.


2.2 A FUNÇÃO DA TEMPERATURA NOS FENÔMENOS QUÍMICOS E BIOLÓGICOS

Outra variante importante é a temperatura da água. De acordo com Furtado (1995, p.30), “a temperatura da água é um dos fatores mais importantes nos fenômenos químicos e biológicos existentes em um viveiro. Todas as atividades fisiológicas dos peixes (respiração, digestão, excreção, reprodução, alimentação, etc.), estão intimamente ligados à temperatura da água”.

Observações feitas no nosso município comprovam que algumas espécies de peixe cultivados, (carpa comum Cyprinus carpio, carpa capim Ctenoharingodon idella, carpa cabeça-grande Aristichthys nobilis, carpa prateada Hypophthalmichtys molitrix, traíra Hoplias malabaricus entre outros), cessam a alimentação durante os meses do inverno, quando a temperatura cai para menos de 15 °C. Já a tilápia (Oreochromis niloticus) e o bagre africano (Clarias gariepinus) morrem com temperaturas abaixo de 12 °C, o que praticamente inviabiliza o cultivo destas espécies na nossa região.

Podemos afirmar que o metabolismo destes peixes é maior, à medida que aumenta a temperatura e menor (podendo cessar ou causar mortalidade) com baixas temperaturas. Ainda de acordo com Furtado (1995, p. 30), “ Os peixes [...] geralmente vivem bem com temperaturas entre 20 – 28 °C; seu apetite máximo está entre 24 – 28 °C.” O que corrobora com a nossa orientação dada no sentido de cessar os procedimentos de arraçoamento e fertilização durante o período mais frio do ano, com exceção da truta arco-íris (Salmo gairdneri).


3 A IMPORTÂNCIA DO PLÂNCTON NA NUTRIÇÃO DOS PEIXES

Numa conceituação genérica podemos dizer que o plâncton engloba todos os organismos microscópicos vegetais (fitoplâncton) e animais (zooplâncton) que tem pequena capacidade de locomoção e que vivem ao sabor da corrente da água.

As larvas dos peixes, após a absorção do saco vitelino, alimentam-se do plâncton. Quando alimentadas com organismos vivos, elas apresentam taxas mais elevadas de crescimento e sobrevivência.

Para Furtado (1995, p. 46), “o plâncton é para a larva de peixe, quanto o leite materno é ao recém-nascido.” Pois apresentam todos os nutrientes necessários para o desenvolvimento saudável das larvas.

É importante salientar que existem diversos fatores que interferem principalmente na produção primária (fitoplâncton), os quais estão ligados ao clima, penetração da luz solar, precipitação atmosférica, temperatura da água e a dinâmica dos nutrientes inorgânicos (nitratos, fosfatos, carbonatos, etc.).

Podemos afirmar ainda que na piscicultura semi-intensiva o manejo preconiza a produção de quantidades ideais de plâncton, fundamentalmente para a engorda da carpa cabeça-grande (Aristichthys nobilis) e carpa prateada (Hypophthalmichtys molitrix), ambas se alimentam quase que exclusivamente de plâncton e podem passar dos 20kg. Para que quantidades ideais desses micronutrientes possam ser disponibilizados é necessário que se proceda com a calagem e adubação orgânica ou inorgânica.

O tema é controverso, já que existem discrepâncias entre autores em relação à quantidade de adubo orgânico a ser aplicado num hectare de lâmina de água. Para (MOREIRA et al., 2001), 4,0 a 6,0 toneladas de esterco seco de aves ou suínos, dividido em aplicações quinzenais de 200 a 250 kg/ha seria suficiente. Já (FURTADO, 1995), preconiza a aplicação de 1 tonelada de esterco seco de aves quinzenalmente ou 1,4 tonelada de esterco de suínos respectivamente.

Podemos afirmar, que a quantidade de adubação orgânica a ser aplicado por hectare de lâmina de água depende de condições específicas de cada situação, pois fatores como taxa de renovação de água, temperatura, oxigênio dissolvido, presença de outros materiais orgânicos mortos (vegetação) entre outros, desempenham papel fundamental para a dosagem adequada da adubação, onde não se pode incorrer em indicações genéricas, pois cada caso é um caso.

Importante frisar que o esterco deve ser bem curtido, do contrario estaremos promovendo a poluição nos cursos de água, devido principalmente aos coliformes fecais e outros patógenos que podem estar presente no esterco. Devemos portanto, avaliar o impacto ambiental que a adubação orgânica pode causar, para não incorrermos em erros e práticas que venham contribuir com a degradação do meio ambiente.


4 CONCLUSÃO

Concluímos com esse trabalho, que a nutrição correta dos peixes de água doce, na geração de energia, exige grande conhecimento nas áreas da limnologia química, física e biológica, onde a matéria prima não é o peixe e sim a água. Portanto, faz-se necessário conhecer todos os aspectos e as variáveis para poder utilizá-las a nosso favor e não como um empecilho que venha comprometer um empreendimento de cultivo.

Por outro lado, é fundamental conhecer profundamente os peixes que se pretende cultivar, seus hábitos alimentares, a conversão alimentar em peso, bem como sua adaptabilidade quanto as variações de temperatura ao longo do ano.

Por fim, vimos que o plâncton é um ingrediente indispensável na nutrição de algumas espécies de peixes, bem como a adubação orgânica (cuja quantidade não pode ser resultado de indicações genéricas), para sua obtenção em quantidade ideal, observando sempre a interligação de diversos fatores internos e externos de cada caso e o impacto ambiental que esta prática pode causar.


5 REFERÊNCIAS

FURTADO, José Francisco Rodrigues. Piscicultura: uma alternativa rentável. Guaíba: Agropecuária, 1995.

MOREIRA, Hedem Luiz Marques et al. Fundamentos da moderna piscicultura. Canoas: Ulbra, 2001.

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